sábado, 5 de fevereiro de 2011

Rótulos, etiquetas, gavetas e arquivos...

Ao fim de uns quantos meses, e casualmente (ou não) no dia seguinte a ter ido ao Hospital fazer análises para ver como se anda a portar o meu querido inquilino, resolvi aparecer na reunião do grupo de auto-apoio.
É curioso como por vezes, necessitamos ver-nos reflectidos nos olhos dos outros, para ver como nos encontramos. Rodeado por alguns já velhos conhecidos, e outras tantas caras novas (pelo menos para mim, depois de uma longa ausência) ouvi repetidamente amáveis comentários acerca do meu aspecto.
"Estás muito bonito"; "Tens muito boa cara"; "Mas que bem te vejo"...
Não sei se seriam as saudades ou se realmente é visível a serenidade com que tenho conduzido a minha vida nos últimos tempos.
Talvez seja a despreocupaçao com que lido com o problema desde há alguns meses... passam os dias, e não tenho mais do que um breve instante diário em que me lembro do meu íntimo companheiro de viagem... o instante em que soa o alarme do telemóvel para tomar a ditosa pastilha.
É curioso como nos adaptamos a um conjunto de circunstancias, e com o tempo incorporamos novas rotinas no nosso dia-a-dia sem darmos por isso...
Os efeitos secundários da medicação, honestamente não sei se já não os tenho, ou se simplesmente os encaro com tal normalidade que já não são de todo relevantes na minha vida.
Assim, e porque apenas uma vez cada quatro meses tenho que realizar a peregrinação ao hospital para a colheita de amostras e duas semanas depois para a consulta com o médico, talvez por isso me esqueça do que trago cá dentro... não será com certeza nenhuma sobra de Adamastor... acho que esse Cabo das Tormentas já o atravessei... agora apenas de vislumbra o feixe de luz ocasional emitido por um farol e que me diz onde estou... por onde é o meu caminho...
Isto deixa-me livre!
Livre para me ocupar de outros assuntos. Assuntos de gente "normal" tais como contas para pagar, assuntos de trabalho, manutenção ou reestruturação da rede de amizades... Dou por mim a recuperar aos poucos parte da minha antiga personalidade. Firmeza nas minhas decisões, e nos passos que dou na vida. Obviamente há aspectos que variaram... uns pela simples passagem do tempo, outros pela nova perspectiva que uma doença crónica nos dá (sobretudo a noção de se ser finito e o desejo de não estar de mal com ninguém...) mas sempre desde uma postura digna e que requer muitas vezes determinação nas palavras e actos, e aquilo a que os americanos designam por Rough Love.
Em alguns círculos, a minha condição de seropositivo deixou de ser desconhecida... Não exactamente por vontade nem por decisão minhas, mas enfim... O que posso, e devo dizer, é que a estas alturas da vida, não vou deixar que os rótulos que me queiram colar afectem quem sou... pelo contrário. Quando rotulamos alguém estamos a evidenciar os nossos próprios medos e pensamentos... Por isso, embora rodeado de uma sociedade que tem necessidade de rotular, classificar e arquivar cada coisa no seu lugar, cada vez com mais razão procuro conhecer-me e saber quem sou. Não pelo que digam a meu respeito, mas sobretudo, para saber por onde vou... para onde vou! Na verdade, ao encasilhar-nos em algum estereótipo, a sociedade faz-nos um favor. Podemos ver aos olhos dos outros, aspectos de nós próprios que não veríamos de outra forma. Mas este exercício deve ser realizado com a condicionante de apenas o levar a cabo caso estejamos verdadeiramente seguros de quem somos.
Gostei de voltar ao grupo! Gostei que me dissessem "Que bom ver-te"; "Que bem te vemos" (um piropo nunca cai mal) e desta vez, constatar que alguém sentiu a minha falta. Que não só estavam à espera que aparecesse, mas interessaram-se por saber os motivos do meu bem-estar!
Espero poder voltar em breve! Continuarei a contar-vos...

2 comentários:

Paula Antunes disse...

LOL Mas tu és um homem realmente bonito. Porquê a admiração? ;)

Zé Ninguém disse...

LOL
Será que nunca acreditei muito nessa cantiga... mas acho que o meu charme reside aí mesmo.. se alguma vez tivesse acreditado, seria insuportável!
Beijinhos, Paula!